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Historias & Historinhas

 

   Os 101 Dalmatas

 

Era uma vez um dálmata chamado Pongo que vivia com um jovem músico, desarrumado e sonhador. Pongo tomava bem conta do seu amo, Roger Radcliff, e levava-o  todos os dias a apanhar ar no parque. Naquela tarde, o calorzinho da Primavera encheu Pongo de  melancolia. “Somos felizes juntos pensava - contudo, em certos dias, sinto-me  cheio de viver nesta casa em desordem com um dono tonto, sempre  mergulhado no seu trabalho…”

De repente, levantando o nariz,  avista, ao longe, uma deliciosa jovem que se passeia na companhia  duma encantadora dálmata.

“Ali está o que nos falta! - imaginava Pongo, completamente  excitado. -Companheiras perfeitas!”

Puxou a trela e contorceu-se, mas Roger, sempre na lua, näo viu  nada.

“Bolas! - resmungou Pongo. – Agora desapareceram…”  Lançou-se pela ponte de madeira. Meu Deus! A jovem e a cadela,  que estavam no relvado, näo se assemelhavam nada às que Pongo procurava! Percorreu as alamedas do parque, com o coraçäo a bater, cheirando  cada erva.. “Mas para onde foram elas?” Tornou a mudar de direcçäo, puxando sempre o pobre do Roger.  Este, por seu lado, näo percebia o ímpeto do seu cäo, que  costumava passear tranquilamente. De súbito, perto do ribeiro, Pongo deteve-se, de repente, e Roger  quase caiu por cima dele: estavam lá. “Desta vez näo as posso deixar fugir -disse o dálmata. - Tenho  de agir e depressa”. Precipitou-se em direcçäo à jovem e pôs-se a girar freneticamente  à sua volta. Enrolados na trela, completamente atordoados, Roger e a jovem,  furiosos, num instante se viram no chäo. A dálmata foi buscar o chapéu da dona e, saindo da água, passou  desdenhosa e altiva junto de Pongo. Näo parecia apreciar, de modo  algum, a sua aparência! A jovem olhou para Perdita, que era o nome da cadela, e näo pôde  deixar de rir, vendo a sua fúria.

Roger, ainda confuso, ajudou-a a levantar-se e, vendo-a täo  alegre, também desatou a rir. Ambos encontraram depressa o bom humor: Perdita näo queria nada  com Pongo mas, contudo, instalava-se já entre eles, uma doce  cumplicidade… A jovem apresentou-se: chamava-se Anita. Os dias que se seguiram foram deliciosos. Todas as tardes, Roger  encontrava Anita no parque e Pongo brincava com Perdita. O que tinha de acontecer aconteceu. Roger casou com Anita e os  dois dálmatas nunca mais se separaram. Em breve o ventre de Perdita começou a ficar redondinho e, uma  bela manhä, Nani, a gentil cozinheira, descobriu uns adoráveis cäezinhos bem encostados à sua mama. Correu a mostrar um deles a Roger e Anita. - Vejam como é täo querido! E há quinze. De súbito, a campainha tocou…

Sem largar o precioso fardo, Nani precipitou-se para a porta de entrada. Mal a abriu, abateu-se sobre ela uma tonelada de peles.  Uma abominável e vil mulher esganiçou-se sobre o nariz da pobre  cozinheira.

Era Cruela do Inferno, uma amiga de infância de  Anita. De voz aguda, berrava dobrando-se sobre o cäozito: “Ah! Já nasceram? E ninguém me avisou? Quantos säo? Mas porque é  que säo brancos?” “Acabaram de nascer - respondeu friamente Nani, deitando-lhe um  olhar de desprezo. – As manchas väo aparecer mais tarde”. Roger e Anita chegaram nesse momento.
“Minha querida Anita - vociferou Cruela - vejo que cheguei no  momento certo. Os cäezinhos nasceram, finalmente! Compro-te a  ninhada toda”.
“Nem pense nisso! - interceptou Roger, secamente.

- Estes  cäezinhos não estäo à venda. “Näo seja ridículo, meu pobre amigo - retomou Cruela. - Mal têm  para viver, quanto mais para alimentar todas estas bocas…Quanto? Aceito o vosso preço.”

Roger encolerizou-se! “Saia desta casa. Näo levará os cäes!”

Vexada, Cruela foi-se embora, gritando: “É o que vamos ver!…” Depois, desapareceu batendo ruidosamente com a porta. “Hei-de tê-los! - fulminava ela, interiormente. - Penso que acabo de ter  uma excelente ideia…” Alguns dias mais tarde, ao cair da noite, dois homens suspeitos  tocaram à porta de Roger e Anita. Estes acabavam de sair com  Perdita e Pongo. “Quem é?” - perguntou Nani, entreabrindo a porta. “É da companhia de electricidade. Para verificar a instalaçäo eléctrica”. Dizendo isto, os dois homens, Jasper, o grande e magro, e Horácio, o pequeno e gordo, enfiaram-se na casa apesar dos  protestos de Nani, já desconfiada: “Näo pedimos nada; façam o favor de sair daqui ou chamo a  polícia!” Mas, enquanto a pobre cozinheira perseguia Jasper, que subia ao  primeiro andar, Horácio meteu-se na cozinha. Enfiou os cäezinhos  no seu grande saco e, num abrir e fechar de olhos, os bandidos já  tinham ido embora com a sua colheita, deixando atrás deles Nani,  desesperada. Quando Anita e Roger chegaram, transtornados com o que acabava de  se passar, pensaram logo em Cruela: “Só ela podia organizar  um golpe täo malvado!” Perdita e Pongo tornaram-se em pouco tempo nos cäes mais  infelizes do mundo. Mas Pongo, näo era desses que só se lamentam. “Temos de encontrar os nossos pequenos - disse a Perdita. - Vou  lançar um alerta geral”. Saiu para o jardim e começou a ladrar continuamente. Do outro  lado da cidade, o coronel, um velho cäo reformado, ouviu o pedido  de socorro. “Sargento Tibs - ordenou ele – em sentido! Desapareceu uma  ninhada de quinze cäes. Por acaso sabe alguma coisa sobre o  assunto? Faça-me o seu relatório”. “Justamente -respondeu o gato - parece-me que ouvi, a noite  passada, latidos vindos do castelo do Inferno… “O Castelo do Inferno? Mas, mas, maldiçäo. O castelo é a segunda  residência dessa abominável Cruela - resmungou o coronel. -  Sargento Tibs, temos de nos despachar! Vá lá abaixo imediatamente  e veja o que se pode fazer por estes cäezinhos. Actue!”

“às suas ordens, Coronel!” De imediato, o corajoso gato correu até ao castelo, conseguiu  entrar sem ser visto e começou a procurar. Ouviu barulho atrás duma porta. Eram tiros seguidos de gritos  assustadores.

Precipitou-se para a divisäo e deteve-se na  entrada: Confortavelmente instalados dezenas de bebés dálmatas  assistiam com fervor a um filme de cowboys. “Meu Deus! - pensou Tibs. - Mas quantos säo eles?” Jasper e Horácio, enfiados nas poltronas, com os dedos dos pés  abertos em leque e com enormes sandes na mäo, estavam ali, também  eles, entretidos com o filme. Ninguém reparou no sargento Tibs, excepto um ou dois cäezitos que o olharam espantados. “Shiu! - fez o sargento a um deles. - Sabes onde estäo os quinze  cäezinhos que foram roubados ontem?” “Ali, perto da televisäo - respondeu um deles! - Porquê?” “Tenho de os levar aos pais.”

Tibs näo teve tempo de dizer mais  nada. Ouviu-se um barulho terrível e a porta do saläo abriu-se  bruscamente…” A malvada Cruela, mais impetuosa que nunca, fez a sua entrada  gritando: “Jasper, Horácio, bando de palermas, acham que vos pago para näo  fazerem nada? Que esperais para executar as minhas ordens?” “Mas patroa, os cäes ainda säo muito pequenos. Quase näo lhe däo  para um casaco…” “Um casaco? Que horror! - pensou Tibs que se escondera por baixo  do cadeiräo. Um casaco de pele dos cäes! Pobres pequenos, tenho  que os tirar daqui e depressa!” “Obedeçam! - voltou a dizer a malvada Cruela - Senäo ainda  se väo  arrepender… Volto amanhä e quero o trabalho terminado”. E dito isto deixou ruidosamente o saläo. “Anda daí, - disse Jasper ao seu cúmplice - temos a noite à nossa  frente. Vamos primeiro ver o filme”.

Aproveitando-se do embrutecimento dos dois homens perante a  televisäo, o Sargento Tibs aproximou-se dos cäezitos: “Ei! - murmurou. - Passa a palavra aos outros: Vou ajudar-vos a  sair daqui, mas näo façam barulho!” Tibs abriu docemente a porta e, sem o menor ruído, os cäezitos,  um a um, recuaram para a saída. O Sargento velou pelo bom andamento das operaçöes, impedindo os atropelos. “96, 97, 98, 99  Ufa! Acabou! Ainda há mais?” “Näo, näo. - respondeu o último cäozito. – Somos mesmo 99″. Quando o filme acabou, Jasper e Horácio levantaram-se molemente  para cumprir a sua horrível tarefa… e aperceberam-se que os cäezitos tinham desaparecido. Correram para os apanhar. O Sargento Tibs só teve tempo de  empurrar os pequenitos para debaixo da escada,  recomendando-lhes  silêncio. Furiosos, os dois homens começaram a revistar a casa e foram  primeiro aos quartos. O Sargento Tibs saltou, nesse momento: a via estava  momentaneamente livre e era preciso aproveitar. Apressou a sua  ninhada e, em breve, os 99 cäezinhos já estavam no jardim. Ali,  Perdita e Pongo, que o coronel avisara, esperavam os pequenos,  desassossegados pela impaciência. Qual näo foi a sua surpresa ao verem os 99 bebés dálmatas!

“Depressa, depressa! - aconselhou o Sargento Tibs. Abraçam-se  mais tarde. Agora é preciso fugir rapidamente e näo vai ser  fácil, com toda esta neve!” Começou entäo uma longa caminhada através dos campos. Como os  cäezinhos se cansavam depressa, Pongo e Perdita pegavam neles à vez, mas em breve, também eles estavam täo cansados que logo  tomaram uma decisäo: “Há uma quinta relativamente perto daqui. Vamos lá para que os  pequenos possam repousar ao abrigo do frio. Amanhä de manhä partiremos de novo” No dia seguinte, quando Cruela voltou ao castelo, quase morreu de  raiva logo que os seus dois cúmplices lhe anunciaram o desaparecimento dos cäezinhos. Ficou numa cólera täo violenta que Jasper e Horácio tremiam como varas verdes. “Que cambada de cretinos! - vociferou a malvada mulher. -  Aconselho-vos a encontrar os palermas desses cäes, senäo teräo de  se haver comigo!” Jasper e Horácio, aterrorizados, saltaram para a carrinha e foram  revistar toda a regiäo.

Durante esse tempo, na quinta, enquanto os cäezinhos despertavam  e começavam a fazer barulho, Pongo e Perdita procuravam  desesperadamente um meio de os levar, discretamente, para casa.  Pongo olhou para trás e viu, näo longe dali, um grande camiäo de  mudanças. “Era disto que precisávamos - pensou ele. - De certeza que vai  para a cidade!”  Nesse preciso momento, a carrinha de Jasper e Horácio desviou-se  do camiäo e, de imediato, um carro desportivo travou bruscamente,  detendo-se  a tempo. A cabeça hirsuta de Cruela apareceu à janela  e começou a insultar os dois incapazes. Enquanto ela espumava, uma família de rafeiros, o pai, a mäe e  pelo menos uma centena de cäezinhos, atravessava a rua e subia,  tranquilamente para o camiäo de mudanças.

Pongo e Perdita tinham tido uma excelente ideia: enrolaram-se num bocado de fuligem que havia na granja e desta maneira os 101  dálmatas transformaram-se em 101 rafeiros. Mas, quando o último  dos cachorrinhos saltou para o camiäo e este começou a arrancar,  uma gota de água caiu-lhe no focinho limpando-lhe a fuligem. 

Cruela, que até entäo os olhava distraidamente, compreendeu logo  o disfarce. Mas o camiäo já arrancara.. “Que imbecis vocês säo! - gritou Cruela. - Passaram todos por  baixo do nosso nariz e vocês ficaram aí plantados, de boca  aberta! Dou-vos a última oportunidade: sigam esse camiäo e, desta  vez, esses malditos cäes näo nos podem escapar!” Começou entäo a perseguiçäo. O camiäo tinha um ligeiro avanço e, ainda por cima, andava mais  depressa do que a carrinha dos bandidos. Cruela, vendo que os seus cúmplices näo valiam nada, começou,  também ela, a perseguir os dálmatas. Meteu-se pela pequena rua cheia de gelo, que descia em  ziguezagues na direcçäo da cidade, e, por mais de uma vez, quase  se esbarrou ao desfazer a curva. Por fim, aproximou-se das  traseiras da carrinha. “Eles näo andam! - rugia ela. - Vou ultrapassá-los; tenho de  deter o camiäo”.

Aproveitou a melhor altura para os ultrapassar, buzinando o mais  que podia. Mas, aparentemente, Horácio e Jasper pareciam näo  ouvir. Por fim, a rua alargou um pouco com a aproximaçäo de uma ponte.  Cruela acelerou brutalmente, mas o carro de desporto derrapou no  gelo, e foi projectado para a carrinha que, por sua vez, saiu da  rua. Os dois veículos chocaram lá no fundo… Os dálmatas estavam  salvos!

O camionista que transportava as mobílias estava longe de  adivinhar que levava passageiros clandestinos! O camiäo entrou  por fim nos arredores da cidade. Parou por alguns minutos, devido ao trânsito, e os dálmatas aproveitaram para saltar para a rua. Dois minutos mais tarde  estavam em casa. Quando Nani abriu a porta, ficou estupefacta  perante a quantidade de rafeiros que se impacientavam, lá fora,  ladrando alegremente. “Somos nós, Nani! - gritaram em coro, Pongo e Perdita. - Estamos  um pouco sujos, mas somos nós!” “Meus queridos, meus tesouros, meus amores. Aqui estäo com os  seus pequenos! Mas… oh meu Deus! De quem säo estes pequenos  todos?” “Näo têm família - explicou Perdita. - Mas deixa-nos entrar,  Nani, que nós contamos-te tudo”. “Venham depressa. Parece-me que uma boa limpeza näo vos vai fazer  nada mal!” – cantarolou alegremente a velha cozinheira já de  vassoura em punho para os sacudir.

Anita e Roger, loucos de alegria por encontrarem os seus  dálmatas, näo repararam logo no número impressionante de  cäezinhos que corriam pela casa. Anita, que viu primeiro,  espantou-se: “Mas näo estou a sonhar! Quantos säo, afinal?” “99 ao todo” - respondeu Nani acabando a limpeza.

Perdita contou  a história toda e, comovida, Anita quis logo adoptar os cäes que  näo tinham família. “Peço-te, Roger. Olha para eles. Säo täo giros! Näo terás coragem  de os pôr na rua, pois näo?” “Está resolvido - respondeu Roger. - Ficamos com eles!” Enquanto  Nani, Anita e Perdita se ocupavam a alimentar toda a ninhada,  Roger e Pongo começaram a dançar cheios de alegria por se  encontrarem. Já tarde, na casa em festa, ouviu-se um homem que cantava com  toda a força… e um dálmata que o acompanhava com latidos de  alegria.

 

 

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