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Histórias & Historinhas

 

 Um gato chamado Natal

 

Alan abriu a porta das traseiras na manhã de Natal e encontrou o pátio coberto com um belo manto de neve branca e cintilante. Mas não lhe encontrou qualquer beleza.

Alan sentia-se infeliz, como acontecia muitas vezes, porque não recebera o que queria no Natal. Em vez da arma BB que pedira, Alan recebera uma bicicleta nova. Era uma bicicleta vermelha, reluzente, com rodas cromadas e borlas azuis e brancas, presas no guiador. A maioria das crianças teria ficado contente se a encontrasse ao lado da árvore na manhã de Natal, mas Alan não.

«És muito novo para teres uma arma», explicara a mãe, tentando consolá-lo. Mas não resultara. Ficara amuado toda a manhã. Quando Alan estava triste, queria que todos também estivessem tristes.

Por fim, depois de abertos todos os presentes, o pai pedira a Alan que levasse as caixas e o papel de embrulho para o lixo. Quando Alan atirou os papéis para dentro do barril, um gatinho trémulo espreitou por detrás da vedação e saudou-o com um tímido «miau».

— Xô! — disse Alan, num tom sibilante, ao gatinho, que ignorou a ordem e correu ansiosamente para o rapaz. — Seu vadio. Se tivesse uma arma, dava-te um tiro.

Bateu com a tampa da lata do lixo e dirigiu-se a casa, com o gatinho a correr atrás dele.

Quando Alan subiu as escadas do alpendre ouviu outro «miau», olhou para baixo e viu o gatinho parado junto dos pés dele.

— Pensei que te tivesse mandado embora — disse ele, zangado, e empurrou o gatinho pelas escadas abaixo com a biqueira da bota.

Mas, antes que Alan pudesse abrir a porta e entrar, lá estava o gatinho, a roçar-se nas pernas e a olhar para ele, cheio de esperança.

— Não és um gato a valer — disse, quando se sentou no lanço de escadas e coçou o gatinho atrás das orelhas. — És a coisa mais feia que já vi.

O gatinho estava escanzelado por causa da fome e o pêlo era um emaranhado de cores — castanho e preto e branco e laranja e castanho-claro.

— Tens todas as cores que os gatos podem ter. Mas é Natal — reflectiu — e creio que não há mal nenhum se te der alguma coisa para comeres. — Por isso, entrou na cozinha e voltou com uma malga de leite para o gatinho.

Mas o gatinho mostrou pouco interesse pela comida, embora estivesse esfomeado. Em vez disso, trepou para o regaço de Alan, roçou-se no casaco e começou a ronronar.

— És uma coisinha meiga — disse o menino, acariciando o gatinho feliz.

E, pouco tempo depois, Alan também se sentia feliz. Esquecera-se de que estava zangado por causa da arma BB, e o gatinho magricela já não parecia tão feio.

Com o gatinho debaixo do braço, Alan entrou na cozinha, onde a mãe preparava o jantar.

— Olha o que encontrei! — exclamou radiante, quando pousou o pequeno gato num tapete em frente do fogão e lhe foi buscar outra malga de leite.

— Sabes que não podes ficar com ele — avisou a mãe — mas podes dar-lhe de comer. Afinal, é Natal.

A mãe de Alan não tencionava permitir que o gato ficasse em casa. Este lambeu o leite e acabou por adormecer no tapete em frente do fogão, quando a mãe de Alan se ajoelhou para pegar nele e o pôr de novo no alpendre das traseiras. O gatinho bocejou e espreguiçou-se, roçou o focinho no queixo dela, começou a ronronar e adormeceu de novo.

— És um bichinho amoroso — disse ela, suavemente, pousando-o outra vez no tapete.

O pai também disse que Alan não podia ficar com o gato. Mas mais tarde, nesse dia, quando estava sentado a ler em frente da lareira, sentiu uma coisa a puxar-lhe a perna das calças. Quando olhou para baixo, o gatinho brincalhão subiu-lhe pelo braço e, sentando-se no ombro, mordeu-lhe suavemente o queixo e começou a ronronar. Quando o pai de Alan tirou o gatinho do ombro e o segurou nas mãos, o gatinho levantou os olhos e fez «miau» ao homem que lhe sorria. Ao fim da tarde, o gatinho tinha encontrado um lar.

— Como lhe vamos chamar? — perguntou Alan quando a mãe o meteu na cama.

— O gato é teu — disse a mãe. — Mas, uma vez que veio hoje, por que não lhe chamas Natal?

E Alan adormeceu com o gatinho chamado Natal aninhado ao lado dele.

O menino acabou por adorar Natal. «Era o melhor presente de Natal que podia receber», pensou. No Verão seguinte, passaram horas intermináveis juntos e, quando Alan regressou à escola, no Outono, chegava a casa todas as tardes e encontrava Natal à espera dele na porta das traseiras, ansioso pelo regresso do companheiro de brincadeiras.

Natal corria atrás de Alan pelo grande carvalho acima, ou andava no atrelado, ou tentava apanhar a cauda de um papagaio quando o amigo o lançava na direcção do céu claro e azul. Natal era o melhor amigo de Alan, e este já não era um menino infeliz.

Embora fosse evidente que toda a gente na família adorava o gatinho, e ele estava sempre ansioso por lhes retribuir esse amor, Alan sabia que era dele que Natal gostava mais. Mas a mãe de Alan, quando Natal, todo contente, se roçava nas suas pernas enquanto ela preparava uma refeição, e o pai, quando estava sentado a ler o jornal com o gato enroscado no colo a ronronar, achavam que Natal gostava mais deles. Achavam que o gatinho devia amá-los mais do que um gato alguma vez amou uma pessoa. Mas Natal era assim.

Então, uma tarde, quando o Outono começou a dar lugar ao Inverno e Alan chegou a casa depois das aulas, Natal não estava à espera, como era habitual, o rapazinho percebeu que algo de errado se passava. Foi ao quarto e encontrou Natal enroscado na cama. O pequeno gato tremia e o focinho estava quente. Alan foi chamar a mãe e, embora ela, Alan e o pai tivessem feito tudo o que podiam para pôr Natal bem, o gatinho piorou e morreu pouco tempo depois.

Alan ficou muito abalado. E, embora os dias se alongassem em semanas e o Natal estivesse de novo à porta, nada parecia animá-lo.

Então, um dia, quando ele se encontrava sentado em silêncio em frente da árvore de Natal na casa dos avós, a ver as luzes a cintilar a avó perguntou-lhe:

— Por que estás tão triste, rapazinho? Esta é a estação da alegria.

— Estou triste por causa do Natal — disse Alan. — Afinal porque é que ele veio?

Sem perceber que ele estava a falar do gatinho que aparecera na casa de Alan na manhã de Natal, a avó sentou-o no colo e disse:

— Porque morreu tão novo? — perguntou Alan. — Como é que posso estar alegre?

— Porque o amor que ele trouxe não morreu. Estará sempre contigo — explicou a avó.

E, quando Alan regressou a casa e olhou para a árvore a que Natal trepava ou para o atrelado onde costumavam brincar, já não se sentiu. Em vez disso, recordou o amor que o gatinho lhe trouxera. E sentiu-se feliz.

Então percebeu porque é que Natal tinha vindo.

 

Rand Souden

Jack Canfield; Mark Victor Hansen
Canja de galinha para a alma – O tesouro do Natal
Mem Martins, Lyon Edições, 2002

 

 

 

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