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III - AÇÃO ORDINÁRIA E EXTRAORDINÁRIA DO DEMÔNIO

 

 Capitulo 2: A infestação

 

 

"Não temos que lutar somente

contra a carne e o sangue, mas sim

contra os principados e as potestades,

contra os dominadores deste mundo de

trevas, contra os espíritos malignos

espalhados pelos ares.. "

(Ef 6, 10-11)

 

 

A TERMINOLOGIA a respeito da ação extraordinária do demônio sobre os homens, as coisas e os locais, não é uniforme: alguns autores falam em obsessão, para designar essa atuação demônio, quer se trate de sua simples presença local, quer de atuação sobre o homem, mas sem possuí-lo, quer da possessão. Adotamos aqui a terminologia utilizada por Mons. Corrado Balducci, por parecer-nos  simples e direta: infestação local, infestação pessoal e possessão diabólica. (Cf Mons. C. BALDIJCcI, Gli indemoniati, p. 3; El diablo, pp. 156-158.)

 

Trataremos em primeiro lugar das duas formas de infestação — a local e a pessoal; no capítulo seguinte, da possessão.

 

Infestação local

 

A infestação local consiste em uma atividade perturbara que o demônio exerce diretamente sobre a natureza inanimada (reino mineral, elementos atmosféricos, etc.) e animada inferior (reino vegetal e reino animal), e também sobre lugares, procurando desse modo atingir indiretamente o homem, sempre em modo maléfico. Com efeito, todas as criaturas, mesmo as irracionais, por maldição do pecado, ficaram sob o poder do demônio (cf. Rom 8, 21ss). Assim, os lugares e as coisas, do mesmo modo que as pessoas, estão sujeitas à infestação demoníaca. E preciso não esquecer a atuação dos demônios dos ares, a respeito das quais nos adverte o Apóstolo: “Não temos que lutar somente contra a carne e o sangue, mas sim contra os principados e as potestades, contra os dominadores deste mundo de trevas, contra os espíritos malignos espalhados pelos ares...” (Ef 6, 10-11).

Entram nessa categoria as casas e lugares infestados: objetos que voam ou se deslocam de lugar, sons estranhos ou perturbadores (passos, pedradas nas vidraças ou no telhado, uivos, gritos, gargalhadas); impressão de presenças invisíveis, sensação de perigos inexistentes, etc.; distúrbios visíveis, estranhos e repentinos que se verificam no mundo vegetal e no mundo animal (árvores ou plantações que secam repentinamente, doenças desconhecidas nos animais, pragas, etc.).

Certos fenômenos ou calamidades de aparência e estruturas naturais (tempestades, terremotos e outros cataclismos, incêndios, desastres, etc.) podem ter igualmente o demônio como autor, senão único direto (como na possessão), ao menos parcial e dirigente. Por exemplo, o raio que caiu do céu e consumiu os pastores e as ovelhas de Jó, do mesmo modo que o vento do deserto que fez cair a casa dos filhos do Patriarca, esmagando-os sob as ruínas, foram suscitados por Satanás (Jó 2, 16-19). Nesse caso, podem ser incluídos essas manifestações demoníacas extraordinárias. Muitas vezes, tais manifestações ocorrem em concomitância com casos de infestação pessoal ou de possessão diabólica.

 

 

Infestação pessoal (obsessão)

 

A infestação pessoal é uma perturbação que o demônio exerce, já não mais sobre o mundo material e as criaturas irracionais, mas sobre uma pessoa, diretamente, sem contudo impedir-lhe o uso da inteligência e da livre vontade. Apesar de ser excepcional, é talvez o mais freqüente dos três tipos de atividade maléfica extraordinária - isto é, infestação local, infestação pessoal, possessão. Como a infestação local, a pessoal também comporta graus de intensidade, e diversa modalidade.

A infestação pessoal pode ser externa ou física e interna ou psicológica, conforme se exerça sobre os sentidos externos ou internos e sobre as paixões do homem. Com freqüência, a infestação é simultaneamente externa e interna.

 

Na infestação externa ou física, demônio age sobre nossos sentidos externos: a vista, provocando aparições sedutoras ou, contrário, apavorantes; a audição, fazendo ouvir rumores, palavras ou canções obscenas, blasfêmias, convites, agrados ou ameaças; o tacto, com sensações provocantes, abraços, movimentos carnais; então dores, doenças, etc. Mas o demônio pode atuar também sobre os sentidos internos (fantasia e memória) e sobre as paixões. A infestação interna ou psicológica consiste em sugestões violentas e tenazes: idéias fixas, imagens expressivas e absorventes, movimentos profundos de emotividade e de paixão - por exemplo, desgostos, amargura, ressentimentos, ódio, angústias, desespero; ou, ao contrário, inclinação para algum objeto ilícito, ou inclinação, de si lícita, mas desregrada quanto ao modo e à intensidade. Comenta o Pe. Tanquerey: “A pessoa se sente, embora com desgosto, invadida por fantasias importunas, tediosas, que persistem não obstante os esforços vigorosos para afastá-las; ou então por frêmitos de ira, angústia, desespero, ímpetos instintivos de antipatia; ou pelo contrário, por perigosas ternuras sem razão alguma que as justifiquem” . (Adolphe TANQUEREY, Precis de Théotogie Ascétique ei Mystique. p. 958.)

 

Os acessos de melancolia e os transportes de furor que afligiam Saul, por obra de um demônio e por permissão divina ( cf. 1 Reis 16, 14-23), são característicos da infestação pessoal interna, infestação psicológica. Diferentemente do possesso, o infestado guarda a disposição de seus atos exteriores, embora em muitos casos tenha sua liberdade diminuída. Ele conserva o poder de reagir contra as sugestões do interior (por exemplo, sugestões de blasfêmias), de julgar sobre o valor moral destas sugestões, achando-as abomináveis. Uma das modalidades de infestação pessoal, talvez das mais freqüentes são as doenças, muitas vezes desconhecidas e incuráveis, que chegam a levar à morte, se Deus o permitir. É o que, aliás, lemos no livro de Já: “Disse, pois, o Senhor a Satanás: Eis que ele (Jó) está na tua mão; conserva, porém, a sua vida” (Jó 2, 6). As escrituras apresentam vários casos de tais enfermidades de origem de diabólica. Exemplo clássico, é a lepra que cobre de chagas o justo Jó, da planta dos pés até o alto da cabeça (Jó 2, 7-8). Seriam igualmente vítimas de infestação diabólica a mulher encurvada, atormentada pelo demônio havia dezoito anos, de tal sorte que não se podia endireitar, e que foi curada por Nosso Senhor (Luc 13, 11); o menino epilético (Mt 17, 14; Mc 9, 17; Luc 9, 38); o mudo (Mt 9,32); e o cego mudo (Mt 12, 22).

 

Mons. Balduecci se refere a doenças de origem demoníaca, por efeito de malefícios, observando que nestes casos os distúrbios são com freqüência de ordem física, sendo dificilmente diagnosticados pelos médicos; outras vezes se trata de inconvenientes que atacam a vida psíquica, a própria personalidade do indivíduo, tomando-o difícil, raivoso e até incapaz de atuar no âmbito de sua vida familiar e social. (Cf. Mons. C.BALDUCCI, El diablo, p. 184.) Convém precisar que muitas das manifestações acima descritas, embora próprias às infestações locais ou pessoais, não são exclusivas delas e nem sempre são de origem demoníaca; várias anomalias de ordem psíquica (ilusões, alucinações, delírios) podem se externar pelos mesmos fenômenos; um cuidadoso exame do indivíduo e das circunstâncias que acompanham os fatos poderá revelar a origem natural patológica ou demoníaca dos distúrbios.

 

Vítimas prediletas da infestação

 

Se bem que qualquer pessoa possa ser vítima desse tipo de tormento diabólico, Mons. Balducci indica três categorias de pessoas que estariam mais sujeitas a ele: os santos, os exorcistas e demonólogos, e os maleficiados (vítimas de malefício). Os santos, por causa do ódio que o demônio tem daqueles que de modo especial amam a Deus e procuram a perfeição; isto, do lado da intenção do demônio; do lado da permissão divina, esta é dada como provação especial a almas muito eleitas. Vários santos a experimentaram. Entre os antigos, basta lembrar Santo Antão; do mesmo modo Santa Catarina de Siena (1347-1380); São Francisco Xavier (1506-1552); Santa Teresa de Jesus (1515-1582); Santa Maria Madalena de Pazzi (1566-1607); São João Batista Vianney, o Cura d’Ars (1786-1859) São João Bosco (1815-1888); Santa Gemma Galgani (1878-1903)*.

 

Os exorcistas e demonólogos: a razão é tão óbvia que quase não é preciso dá-la; os primeiros, com seu ministério, fazem diminuir a presença do demônio no mundo e libertam suas vítimas; os segundos, com seus estudos, esclarecem os fiéis com relação à existência e atividade demoníacas.

 

Os maleficiados (vítimas de malefício), por permissão de Deus, para seu castigo, ou provação, ou para manifestar o poder divino. (Cf. Mons. C. BALDUCCI, El diablo, p. 179.)

 

* Esta Santa leiga, grande mística, recebeu os estigmas da Paixão, tinha freqüentes visões de Nosso Senhor e de Nossa Senhora, e um comércio quase contínuo com seu Anjo da Guarda. Foi muito atormentada pelo  demônio que a espancava com uma vara durante horas e horas, às vezes a noite inteira, causando-lhe profundas esquimozes no corpo, que duravam vários dias, até que Nosso Senhor as curasse. Perseguia-a por toda a parte, em casa, na rua, na igreja, com aparições, assumindo o aspecto de um cachorro, de um gato, de um macaco, de pessoas conhecidas, ou de homens ferozes e espantosos. Várias vezes um desses homens horríveis a jogou na lama quando saia de casa para ir comungar. O demônio lhe aparecia também sob a figura de seu confessor, Mons. Volpi e outras debaixo da aparência do Anjo da Guarda, chegando a confundi-la; de certa feita o Maligno assumiu a figura de Jesus flagelado, com o coração aberto e todo ensangüentado, para pedir-lhe maiores penitências, com a dupla finalidade de fazer deteriorar sua já delicada saúde e incitá-la a desobedecer o confessor que as havia proibido (Mons. C. BALDUCCI, El diablo PP. 179-181).

 

(Fonte: internet. Autoria:“Anjos e Demônios - A Luta Contra o Poder das Trevas”, Gustavo Antônio Solímeo - Luiz Sérgio Solímeo)

 

 

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