MAGIA AFRO-BRASILEIRA & UMBANDA

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POMBA GIRA

 

Na Umbanda, a entidade espiritual que se manifesta incorporada em suas médiuns está fundamentada num arquétipo desenvolvido à partir da entidade Bombogira, originária do culto Angola.

 

Nos cultos tradicionais oriundos da Nigéria não havia a entidade Pombagira ou um Orixá que a fundamentasse.

Mas, quando da vinda dos nigerianos para o Brasil (isto por volta de 1800), estes aqui encontram-se com outros povos e culturas religiosas e assimilam a poderosa Bombogira angolana que, muito rapidamente, conquistou o respeito dos adoradores dos Orixás.

Com o passar do tempo a formosa e provocativa Bombogira conquistou um grau análogo ao de Exu e muitos passaram a chamá-la de Exu Feminino ou de mulher dele.

Mas ela, marota e astuta como só ela é, foi logo dizendo que era mulher de sete exus, uma para cada dia da semana, e, com isso, garantiu sua condição de superioridade e de independência.

Na verdade, num tempo em que as mulheres eram tratadas como inferiores aos homens e eram vítimas de maus tratos por parte dos seus companheiros, que só as queriam para lavar, passar, cozinhar e cuidar dos filhos, eis que uma entidade feminina baixava e extravasava o ‘eu interior’ feminino reprimido à força e dava vazão à sensualidade e à feminilidade subjugadoras do machismo, até dos mais inveterados machistas.

Pombagira foi logo no início de sua incorporação dizendo ao que viera e construiu um arquétipo forte, poderoso e subjugador do machismo ostentado por Exu e por todos os homens, vaidosos de sua força e poder sobre as mulheres.

Pombagira construiu o arquétipo da mulher livre das convenções sociais, liberal e liberada, exibicionista e provocante, insinuante e desbocada, sensual e libidinosa, quebrando todas as convenções que ensinavam que todos os espíritos tinham que ser certinhos e incorporarem de forma sisuda, respeitável e aceitável pelas pessoas e por membros de uma sociedade repressora da feminilidade.

Ela foi logo se apresentando como a “moça” da rua, apreciadora de um bom champagne e de uma saborosa cigarrilha, de batom e de lenços vermelhos provocantes.

“O batom realça os meus lábios, o rouge e os pós ressaltam minha condição de mulher livre e liberada de convenções sociais”.

Escrachada e provocativa, ela mexeu com o imaginário popular e muitos a associaram à mulher da rua, à rameira oferecida, e ela não só não foi contra essa associação como até confirmou: “É isso mesmo”!

E todos se quedaram diante dela, de sua beleza, feminilidade e liberalidade, e como que encantados por sua força, conseguiram abrir-lhe o íntimo e confessarem-lhe que eram infelizes porque não tinham coragem de ser como elas.

Aí punham para fora seus recalques, suas frustrações, suas mágoas, tristezas e ressentimentos com os do sexo oposto.

E a todos ela ouviu com compreensão e a ninguém negou seus conselhos e sua ajuda num campo que domina como ninguém mais é capaz.

Sua desenvoltura e seu poder fascinam até os mais introvertidos que, diante dela, se abrem e confessam suas necessidades.

Quem não iria admirar e amar arquétipo tão humano e tão liberalizado de sentimentos reprimidos à custa de muito sofrimento?

Pombagira é isto. É um dos mistérios do nosso divino criador que rege sobre a sexualidade feminina. Critiquem-na os que se sentirem ofendidos com seu poderoso charme e poder de fascinação.

Amem-na e respeitem-na os que entendem que o arquétipo é liberador da feminilidade tão reprimida na nossa sociedade patriarcal onde a mulher é vista e tida para a cama e a mesa.

Mas ela foi logo dizendo: “Cama, só para o meu deleite e mesa, só se for regada a muito champagne e dos bons!

Com isso feito, críticas contrárias à parte, o fato é que o arquétipo se impôs e muita gente já foi auxiliada pelas “Moças da Rua”, as companheiras de Exu.

A espiritualidade superior que arquitetou a Umbanda sinalizou à todos que não estava fechada para ninguém e que, tac como Cristo havia feito, também acolheria a mulher infiel, mal amada, frustrada e decepcionada com o sexo oposto e não encobriria com uma suposta religiosidade a hipocrisia das pessoas que, “por baixo dos panos”, o que gostam mesmo é de tudo o que a Pombagira representa com seu poderoso arquétipo.

Aos hipócritas e aos falsos puritanos, pombagira mostra-lhes que, no íntimo, ela é a mulher de seus sonhos… ou pesadelos, provocando-o e desmascarando seu falso moralismo, seu pudor e seu constrangimento diante de algo que o assusta e o ameaça em sua posição de dominador.

Esse arquétipo forte e poderoso já pôs por terra muito falso moralismo, libertando muitas pessoas que, se Freud tivesse conhecido, não teria sido tão atormentado com suas descobertas sobre a personalidade oculta dos seres humanos.

Mas para azar dele e sorte nossa, a Umbanda tem nas suas Pombagiras, ótimas psicólogas que, logo de cara, vão dando o diagnóstico e receitando os procedimentos para a cura das repressões e depressões íntimas.

Afinal, em se tratando de coisas íntimas e de intimidades, nesse campo ela é mestra e tem muito a nos ensinar.

Seus nomes, quando se apresentam, são simbólicos ou alusivos.

- Pombagira das Sete Encruzilhadas;

- Pombagira das Sete Praias;

- Pombagira das Sete Coroas;

- Pombagira das Sete Saias;

- Pombagira Dama da Noite;

- Pombagira Maria Molambo;

- Pombagira Maria Padilha;

- Pombagira das Almas;

- Pombagira dos Sete Véus;

- Pombagira Cigana; etc.

O simbolismo é típico da Umbanda porque na África, ele não existia e o seu arquétipo anterior era o de uma entidade feminina que iludia as pessoas e as levavam à perdição. Já na Umbanda, é o espírito que “baixa” em seu médium e, entre um gole de champagne e uma baforada de cigarrilha, orienta e ajuda a todos os que as respeitam e as amam, confiando-lhes seus segredos e suas necessidades. São ótimas psicólogas. E que psicólogas! “Salve as Moças da Rua”!

TEXTO DE RUBENS SARACENI

(Fonte: internet)

 

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