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MITOS E MITOLOGIA

MITOLOGIA Egípcia

(Fonte:”Dicionario de mitologia”, de Tassilo Orpheu Spalding)

 

O MITO DE Osíris

 

Ao lado de mitos que investigam ou procuram explicar os enigmas do Universo, outros há que pretendem resolver certos problemas essencialmente humanos.

Nada preocupava mais os egípcios que a Morte e a Vida além-túmulo. Que era a Morte? Qual o destino do homem depois da Morte?

Sabemos com certeza que os egípcios sempre creram numa vida além-túmulo. Dessa vida fizeram uma imagem concreta, que variou no decorrer das idades e segundo as circunstâncias. As gentes do povo, no início, esperavam, apenas, que a outra vida fosse igual a que neste mundo tinham levado. Os reis, po­rém, ambicionavam destino bem mais sublime, como o mostram os Textos das pirâmides. O rei tinha direito a uma outra vida "celeste": Purificado nas águas de uma lagoa mítica, tomava lugar na barca solar e acompanhava ré na sua rota diária atra­vés do Oceano do céu. Intimamente associado ao deus solar, recebia as homenagens dos deuses e dos gênios que povoavam aquelas regiões.

Mas o faraó poderia ter outro destino depois da morte: Ficar sob a dependência de Osíris, considerado desde as mais longín­quas eras como o protótipo dos reis defuntos e elevado ao posto de soberano do país dos Bem-aventurados.

O papel funerário de Osíris é certamente muito antigo; entre­tanto, sua popularidade como deus dos defuntos acentuou-se no decorrer das eras, ao mesmo tempo que se desenvolveu o mito que melhor manifesta essa sua característica.

A lenda de Osíris tomou corpo no Império Antigo, como o provam os Textos das pirâmides e os hinos de todas as épocas. Contudo, pouco sabemos acerca das origens de Osíris. O nome parece significar "a Sede do Olho" e deve conter uma alusão mitológica que constitui para nós verdadeiro enigma.

Admite-se, geralmente, que o culto de Osíris nasceu, como tantos outros cultos antigos, no Delta. Em Busíris, cidade que guarda a lembrança de Osíris, assimilaram este deus a uma divin­dade local, Anedjti, que aparece sob os traços de um deus-rei com os atributos da soberania.

Sob o Antigo Império, o culto de Osíris, popular no Alto Egito, implantou-se em Abidos, cidade onde se encontrava uma velhíssima necrópole real que tinha como protetor o deus Quenti­-I mentiu, "O Chefe dos Ocidentais" (isto é, o deus que presidia aos destinos dos falecidos). Pouco a pouco a personalidade de Osíris se confundiu com a do deus local; Abidos tornou-se o cen­tro do culto de Osíris, considerado doravante como o deus fune­rário por excelência. Ampliou-se o mito e novos elementos vie­ram enriquecê-lo; surgiu, assim, a tocante lenda da qual Plutarco nos deixou uma versão romanceada.

Com elementos fornecidos pelos documentos egípcios e pela narrativa de Plutarco, assim podemos reconstituir o mito sob sua forma mais completa e primitiva.

O deus Gebeb, que aparece comumente como o representante mais típico da instituição real fundada por Atum, transmitiu seus poderes ao filho, Osíris. .Assistido de sua irmã e esposa, Ísis, inaugurou um reino onde todos os mortais seriam felizes. Divulgou entre os homens a agricultura, a viticultura e as artes. Mas seu irmão Set (Tífon ou Tifão), que havia desposado Néftis, começou a invejar o sucesso e o poder do jovem irmão; no fundo do coração resolveu eliminá-lo. Durante um banquete con­seguiu fechá-lo num cofre que lançou ao rio. Ísis sai imedia­tamente à procura do esposo e o encontra em Biblos, na Fenícia, encaixado num grosso tronco de tamarindo, que o rei da região havia utilizado na construção do seu palácio. Ísis obtém a resti­tuição do cofre e o transporta de volta para o Egipto. Mas Set consegue apoderar-se do corpo de Osíris; corta-o em catorze pedaços e os espalha através do país. Ísis não descansa enquanto não consegue reaver os membros dispersos do marido; encontra todos, menos o falo. Com a ajuda de Anúbis, de Néftis e de outras divindades aliadas, faz a primeira múmia, a de Osíris. Pouco tempo depois da morte do marido, 1sis, refugiada nos marnéis do Delta, deu à luz um filho, Horo, que criou com infi­nitas cautelas, temendo sempre a ira de Set. Horo, quando atin­giu a idade adulta, empreendeu a tarefa de vingar o assassínio do pai. Trava com Set uma luta corpo a corpo no curso do qual consegue arrancar o pênis do adversário, enquanto este lhe arrebata um olho. Tot então intervém para pepsar as chagas do deus caolho e do deus emasculado. Cura a ambos. Decidem os deuses pôr cobro à luta fratricida e citam os adversários ante um tribunal. A corte divina admite o bom direito de Horo e condena Set a restituir 'a Horo o olho arrancado. Este o dá ao pai, Osíris, e o substitui pelo uraeus (em grego oGpalGt;; , do egípcio aaret) ou serpente divina, que doravante seria um dos emblemas da realeza. Quanto a Osíris, transmite seus poderes ao filho e se retira definitivamente para o reino dos Bem-aven­turados.

Na verdade, os documentos que possuímos não referem :om tanta precisão e tão completamente a história de Osíris.

A análise da lenda osinaca nos permite distinguir vários temas, dos quais, os mais importantes são: a morte do deus­-rei Osíris e sua substituição pelo filho Horo; a luta cósmica entre Horo, o deus do Céu e da Luz com Set, o deus dos Elementos desencadeados, por essa razão assimilado por Plutarco a Tífon ou Tifão; finalmente o Olho de Horo, que, depois de ter sido arrebatado ao seu proprietário, lhe é restituído para se transfor­mar em uraeus, a Serpente divina que permanece em frente ao rei.

Além disso o mito explica satisfatoriamente as múltiplas virtudes e qualidades que os egípcios atribuíam a Osíris. Inicial­mente ele aparece com Horo como o representante de um dos aspectos da realeza e explica a continuidade hereditária da consti­tuição monárquica. Osíris é o protótipo do rei defunto, que, depois de concluir sua tarefa terrestre, em morrendo transmite, a dignidade real ao filho, legítimo sucessor dos direitos paternos; finalmente, ressuscita sob forma beatificada e na região dos Bem­-aventurados descansa para todo o sempre.

Todos os reis que se sucederam no trono do Egipto, passaram por essas duas fases: Investidos da dignidade real de Horo enquanto durasse o reinado, se transformaram em Osíris no termo da sua carreira, quando transmitiam ao filho e sucessor o direito real, e como tal eram honrados pelos filhos e súditos.

Osíris era também, desde o início, considerado como um dos grandes deuses da Vegetação. Pela sua morte e imersão nas águas do Nilo, seguidas pela gloriosa ressurreição, evoca, no plano mítico, as fases da vida da natureza, com o periódico renova­mento do grão que morre para depois germinar em planta, cheia de vida e vigor. Comemorando esse fato, os egípcios, no fim da estação da Inundação (no mês de Khoiakh), realizavam uma cerimónia à qual atribuíam virtudes vitais. Depois de traçarem sobre uma tela ou um estofo a silhueta de Osíris, cobriam-na com leve camada de limo no qual semeavam alguns grãos. Logo estes terminavam e a figura se tornava assim "o Osíris Vegetal", símbolo da renovação da natureza e estímulo para que os homens se dedicassem à agricultura. Esse rito deveria ser realizado nos templos, mas fazia parte da liturgia fúnebre, como o prova a presença de "Osíris Vegetal" em inúmeras tumbas do Novo Império.

Levando em conta as peripécias que precederam a morte de Osíris e se seguiram a ela, os egípcios o fizeram deus protector dos mortos. Os ritos fúnebres dos reis, que tinham significado próprio, foram postos em relação com os principais traços do mito da morte e da ressurreição do deus. As fórmulas dos ritos fúnebres, que nos foram conservadas através dos Textos das pirâmides acentuam essa assimilação do rei morto com o deus Osíris. Quando, no fim do Império Antigo, correntes políticas e sociais abalaram o prestígio da realeza, os ritos fúnebres osi­nacos, considerados até então como prerrogativas dos reis tão somente, foram usados, em medida sempre crescente, pelos mortais comuns. No Império Médio, apreciável número de funcionários ou egípcios ricos se faziam mumificar e sepultar- se …. os ritos osinacos. A partir do Novo Império, a democratização dos ritos fúnebres generalizou-se de tal sorte que todo e qualquer defunto pôde se beneficiar dessas vantagens; era, então, cha­mado "Osíris UnteI". Para que um mortal pudesse atingir a sobrevivência osiríaca, bastava que seu corpo fosse submetido aos ritos que haviam revivificado Osíris e que se recitasse sobre o defunto as preces usadas para a ressurreição do deus. O famoso Livro dos mortos, que comumente era posto ao lado da múmia, continha, além de outra fórmulas igualmente benéficas, uma selecção de hinos e de preces mediante os quais o proprie­tário do túmulo assegurava para a sua sobrevivência o favor de Osíris e das divindades do seu ciclo.

 

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