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Espaço dedicado à Wicca
A Esfinge e a Cruz
O grande enigma dos séculos antigos, a esfinge, depois de ter
feito a volta ao mundo sem achar repouso, parou ao pé da cruz, este outro
grande enigma; e há dezoito séculos e meio a contempla e medita.
Que é o homem? - pergunta a esfinge à cruz, - e a cruz responde à esfinge,
perguntando-lhe: - Que é Deus?
Já dezoito vezes, o velho Ahasverus fez também a volta do globo; e, no fim de
todos os séculos, e no começo de todas as gerações, passa perto da cruz muda
e diante da esfinge imóvel e silenciosa.
Quando estiver cansado de caminhar sempre, sem nunca chegar, é aí que ele
repousará, e então a esfinge e a cruz falarão por sua vez para o consolar.
- Eu sou o resumo da sabedoria antiga - dirá a esfinge. - Sou a síntese do
homem. Tenho uma fronte que pensa e peitos que se inflamam de amor; tenho
garras de leão para a luta, flancos de touro para o trabalho e asas de águia
para subir à luz. Só fui entendida nos tempos antigos pelo cego voluntário de
Tebas, este grande símbolo da misteriosa explanação que devia iniciar a
humanidade à eterna justiça; mas agora o homem não é mais o filho maldito que
um crime original faz expor à morte do Cytheron; o pai veio, por sua vez,
expiar o suplício do filho; a sombra de Laios gemeu com os tormentos de
édipo; o céu explicou ao mundo o meu enigma nesta cruz. é por isso que eu me
calo, esperando que ela mesma se explique ao mundo: repousa, Ahasverus,
porque é aqui o termo da tua dolorosa viagem.
- Eu sou a chave da sabedoria futura - dirá a cruz. - Sou o signo glorioso do
stauros que Deus fixou nos quatro pontos cardiais do céu, para servir
de duplo eixo ao universo. Expliquei na Terra o enigma da esfinge, dando aos
homens a razão da dor: consumei o simbolismo religioso, realizando o
sacrifício. Eu sou a escada sangrenta pela qual a humanidade sobe a Deus e
pela qual Deus desce aos homens. Eu sou a árvore do sangue, e as minhas
raízes o bebem em toda a terra, para que não seja perdido, e forme nos meus
braços frutos de devotamento e de amor. Sou o sinal da glória, porque revelei
a honra; e os príncipes da terra me penduraram ao peito dos bravos. Um dentre
eles me deu um quinto braço para fazer de mim uma estrela; mas sempre me
chamo a cruz. Talvez aquele que foi o mártir da glória previa o sacrifício, e
queria, acrescentando um braço à cruz, preparar um encosto para a sua própria
cabeça ao lado da do Cristo. Estendo os meus braços tanto à direita como à
esquerda, e espalhei igualmente as bênçãos de Deus sobre Madalena e sobre
Maria; ofereço a salvação aos pecadores, e aos justos a graça nova; espero
Caim e Abel para os reconciliar e unir. Devo servir de ponto de ligação entre
os povos, e devo presidir ao último julgamento dos reis; sou o resumo da lei,
porque trago escrito nos meus braços: Fé, Esperança e Caridade. Sou o resumo
da ciência, porque explico a vida humana e o pensamento de Deus. Não temas,
Ahasverus, não mais temas minha sombra; o crime do teu povo tornou-se o do
universo, porque também os cristãos crucificaram o seu Salvador; eles o
crucificaram, lançando aos pés a sua doutrina de comunhão; eles o
crucificaram na pessoa dos pobres; eles o crucificaram, maldizendo a ti
próprio e prescrevendo o teu exílio; mas o crime de todos os homens os
envolve no mesmo perdão; e tu, o Caim humanitário, tu, o mais velho dos que a
cruz deve resgatar, vem repousar embaixo de um dos seus braços ainda tinto do
sangue redentor! Depois de ti, virá o filho da segunda sinagoga, o pontífice
da lei nova, o sucessor de Pedro; quando as nações o tiverem proscrito como tudo,
quando não houver senão a coroa do martírio, e quando a perseguição o tiver
feito submisso e dócil como justo Abel, então virá Maria, a mulher
regenerada, a mãe de Deus e dos homens; e ela reconciliará o judeu errante
com o último papa, depois começará de novo a conquista do mundo para dá-lo
aos seus dois filhos. O amor regenerará as ciências, e razão e a fé. Então
serei a árvore do paraíso terrestre, a árvore da ciência do bem e do mal, a
árvore da liberdade humana. Os meus imensos ramos cobrirão o mundo inteiro, e
as populações afadigadas descansarão debaixo da minha sombra; os meus frutos
serão o alimento dos fortes e o leite das criancinhas; e as aves do céu, isto
é, os que passam cantando, levados nas asas da inspiração sagrada, estes
repousarão nos meus ramos, sempre verdes e carregados de frutos. Repousa,
pois, Ahasverus, na esperança deste belo porvir; porque é aqui o termo da tua
dolorosa viagem.
Então o judeu errante, sacudindo o pó de seus pés doloridos, dirá à esfinge:
- Eu te conheço desde há muito! Ezequiel te via outrora, atrelada a esta
carruagem misteriosa que representa o universo e cujas rodas estreladas giram
umas nas outras; realizei uma segunda vez os destinos errantes do órfão do
Cytheron; como ele, matei meu pai, sem o conhecer; quando o deicídio se
realizou e quando chamei sobre mim a vingança do seu sangue, me condenei a
mim mesmo à cegueira e ao exílio. Eu fugia de ti e te procurava sempre,
porque era a primeira causa das minhas dores. Mas tu viajavas penosamente
como eu, e, por caminhos diferentes, devíamos chegar juntos; bendito sejas
tu, ó gênio das antigas idades, por me haveres levado ao pé da cruz!
Depois, dirigindo-se à própria cruz, Ahasverus dirá, enxugando a sua última
lágrima:
- Desde há dezoito séculos te conheço, porque eu te vi levada pelo Cristo que
sucumbiu sob este fardo. Abanei a cabeça e te blasfemei então, porque ainda
não tinha sido iniciado à maldição; era preciso à minha religião o anátema do
mundo para lhe fazer compreender a divindade do maldito; é por isso que sofri
com coragem meus dezoito séculos de expiação, vivendo e sofrendo sempre no
meio das gerações que morriam ao redor de mim, assistindo à agonia dos
impérios e atravessando todas as ruínas e olhava sempre com ansiedade para
ver se não estavas caída; e depois de todas as convulsões do mundo, sempre te
via de pé! Mas não me aproximava de ti, porque os grandes do mundo ainda te
haviam profanado, e feito de ti o patíbulo da Liberdade santa! Não me
aproximava de ti, porque a Inquisição tinha entregue meus irmãos à fogueira
em presença da tua imagem; não me aproximava de ti, porque não falavas, ao
passo que os falsos ministros do céu falavam, em teu nome, de danação e
vinganças; e eu só podia ouvir as palavras de misericórdia e união! Por isso,
desde que a tua voz chegou ao meu ouvido, senti meu coração mudado e a minha
consciência se acalmou! Bendita seja a hora salutar que me levou ao pé da
cruz!
Então uma porta se abrirá no céu e a montanha do Gólgota será o seu sólio e,
diante desta porta, a humanidade verá, com admiração, a cruz irradiante
guardada pelo judeu errante, que terá deposto a seus pés o seu bastão de
viagem, e pela esfinge, que estenderá as suas asas e terá os olhos brilhantes
de esperança, como se fosse tomar um novo vôo e se transfigurar!
E a esfinge responderá à pergunta da cruz, dizendo: - Deus é aquele que
triunfa do mal pela prova de seus filhos, aquele que permite a dor, porque
possui em si o remédio eterno; Deus é aquele que é, e diante de quem o mal
não existe.
E a cruz responderá ao enigma da esfinge: - O homem é o filho de Deus que se
imortaliza ao morrer, e que se liberta, por um amor inteligente e vitorioso,
do tempo e da morte; o homem é aquele que deve amar para viver, e que não
pode amar sem ser livre; o homem é o filho de Deus e da Liberdade!
Fonte: “Dogma e Ritual de Alta Magia”, de Eliphas Levi
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