Wicca, Os Deuses da Wicca

Portal a&eOs Deuses da Wicca

 

Muitos Bruxos tradicionalistas insistem em dizer que somente a Deusa da Lua e o Deus de Chifres podem ser cultuados na Wicca, pois Gardner idealizou a Arte como sendo uma religião duoteísta. Wiccanianos no mundo inteiro discutem até hoje se a Wicca é politeísta, duoteísta, monoteísta, panenteísta ou henoteísta. É tanto “teísmo” que talvez esteja na hora de fazermos um Concílio, como os de Nicéia e Constantinopla, para fundamentarmos as “únicas” e “verdadeiras” verdades de nossa religião. Da maneira como estas pessoas falam, parece que nem Gardner ou Doreen Valiente eram Wiccanianos autênticos pois eles próprios mencionaram divindades de panteões variadíssimos na Carga da Deusa original, que faz referências a Deusas de diferentes panteões como Ártemis, Astarte, Dione, Melusina, Ceridwen, Dana, Ísis e tantas outras. Ironias à parte, para mim, esse tipo de afirmação é pura falta de bom senso, preconceito e xenofobia barata. Se não se concorda com o culto à Deusas africanas na Wicca, por exemplo, devemos começar excluindo Ísis da lista de Deusas celebradas, pois até onde eu sei o Egito fica na África!!!Porque Ísis pode ser cultuada e Mawu não, por exemplo? Por qual motivo se uma é tão africana quanto a outra? Concordo com as alegações de muitos de que atualmente as pessoas fazem qualquer mistura e chamam isso de Wicca, mas não dá para generalizar dizendo que aqueles que são ecléticos em sua prática, experimentando o trabalho com Deusas e Deuses de diferentes panteões, não são Wiccanianos! Tal tipo de afirmação é tão absurda ou equivocada quanto dizer que todos os alemães são nazistas. Os Deuses da Wicca são simplesmente A DEUSA e oDEUS, o princípio do Sagrado Feminino e do Sagrado Masculino, que semanifestaram em diferentes culturas com diferentes nomes. A realidade é que atualmente Bruxos em todo mundo celebram Deuses de diferentes panteões e os percebem como manifestações da Deusa e do Deus como um todo. Cada Tradição cultua um casal divino em particular ou um panteão específico. Algumas Tradições, inclusive, cultuam Deuses de diferentes panteões indistintamente a cada ritual. O ecletismo, no sentido de mistura de panteões, sempre existiu. É sabido que gregos e romanos assimilavam os Deuses da cultura que dominavam, e a cultura subjugada associava os Deuses de seu dominador. Os egípcios, por exemplo, sofreram uma forte romanização em muitos aspectos de sua cultura e religião até serem extintos por completo. Ísis é chamada de a Deusa Universal por causa de seu culto ter chegado a lugares tão distantes como

Roma ou Portugal. Ísis teve seu culto ligado a Serápis, Diana, Io, Deméter e muitos outros Deuses. Tacitus, em sua obra chamada “Germanicus”, relata que uma tribo escandinava chamada Rus

cultuava Ísis. Até mesmo Ganga, a Deusa do Rio Ganges teve seu culto associado ao de Ísis em algum momento na história. O Papiro Oxyrhynchus,que menciona os nomes e atributos de Ísis em outros países, sugere que ela foi governante do Ganges. Quando Alexandre, o Grande, invadiu partes da Índia deixou reis gregos como responsáveis pelos territórios que foram conquistados. Isso impulsionou, obviamente, a mescla de arquitetura, arte e religião. Como resultado disso, surgiu a arte greco-indiana em Gandhara, onde se criou muitas das convenções artísticas encontradas até hoje nas representações dos Deuses indianos. Ísis influenciou a iconografia de diversas Deusas. Até Kuan Yin passou a ser representada anos depois com o Nó Tyet, o nó de Ísis, amarrado em sua vestimenta. Os antigos Deuses da Índia sofreram alterações marcantes em suas características em decorrência da invasão ariana. Um exemplo claro disso é a própria Deusa Kali, uma Deusa tão antiga cujo culto está na cultura matriarcal da antiga Índia. Sua pele negra demonstra que ela pré-data a invasão ariana (de pele clara), no continente indiano. O conflito entre os invasores e a cultura original indiana pode se rastreado nos próprios mitos de Kali. Em muitos mitos Kali se esforça para defender seu povo contra os invasores (monstros, pragas, pestes, guerreiros, etc). Os invasores arianos introduziram a cultura dos Deuses patriarcais, muitos de pele clara, na Índia. Mas Kali continuou a ser cultuada e retratada como a Mãe Negra por várias tribos que ainda guardam traços do matriarcado em sua cultura, como os Shabara de Orissa .

Arquétipo é a terminologia usada por Jung para “designar o conjunto de imagens psíquicas do inconsciente coletivo que são patrimônio comum de toda ahumanidade”.

Encontramos semelhanças mitológicas e fisionômicas entre o Cernunnos celta e o Shiva hindu, assim como entre os caracteres rupestres de caçadores nas paredes das cavernas dos sítios arqueológicos de Trois-Frères a da Serra da Capivara, no Piauí – Brasil. Os arquétipos são padrões de caráter universal originários do inconsciente coletivo e que constituem o alicerce da mitologia, religião, lenda e contos de fadas de todos os povos. Apesar do arquétipo aproximar duas divindades de panteões distintos não faz delas a mesma deidade, no sentido estrito da palavra. O conceito de “Todas as Deusas são uma só Deusa e todos os Deuses são um só Deus” foi primeiro desenvolvido por Dion Fortune, fundadora da Sociedade da Luz Interior (Inner Light), e depois explorado e ampliado ao redor do mundo através da perspectiva Wiccaniana. No entanto, esse conceito não expressa a noção de arquétipo. Os arquétipos são motivos primordiais, não expressam imagens ou motivos mitológicos definidos. O arquétipo impulsiona a tendência em formar tais representações que podem variar em detalhes, de cultura para cultura, de indivíduo para indivíduo, sem perder sua configuração original, simples e descomplexa. A semelhança de Cernunnos e Shiva expressa o arquétipo do Deus de Chifres e Caçador, não a individuação da Divindade. É comumente aceito que não existe autoridade central na Wicca. Se não existe autoridade central, também não existem leis ou regras que digam que Wiccanianos não possam celebrar Deuses de variados panteões, observadas a coerência e compatibilidade em todo esse processo. Logo, isso é tema que interessa somente a cada praticante, Coven e Grove de acordo com suas diretrizes internas. Os Deuses que alguém celebra é tema que importa somente a pessoa envolvida na questão. Pensando abrangentemente, temos tanto direito de cultuar um Deus hindu, uma deidade Celta ou um Deus mediterrâneo quanto as pessoas que carregam a ancestralidade dos povos que cultuaram ou ainda cultuam esses Deuses pois todos andamos sobre a mesma Terra, nascemos da mesma Mãe: a Deusa. Quando cultuamos Deuses indígenas ou africanos na Wicca, por exemplo, isto não quer dizer que os celebraremos exatamente como estas culturas o fazem, mas que usaremos apenas o arquétipo daquela Deidade para nos conectarmos com um tema universal seja ele o amor, a proteção ou sabedoria. O ritual realizado àquela divindade na Wicca não será indígena ou africano. Tais Deuses serão cultuados à maneira Wiccaniana, usando-se apenas o seu arquétipo e nome como fonte de inspiração e força para despertar uma energia e consciência única. Alguns podem dizer que isso não é suficiente para justificar o culto aos Deuses de diferentes culturas na Wicca e dar muitas outras explicações do porque isso não deve ser feito baseadas em territórios geográficos estabelecidos pelo homem, que ao meu ver só enfraquecem tanto o Paganismo quanto a luta que hoje travamos para construir pontes entre o que nos separa. Eu digo que não há fronteiras para o Sagrado e o chamado para servir uma Deidade deste ou daquele Panteão pode surpreender qualquer um de nós nos momentos mais inesperados de nossas vidas. Somos cidadãos do mundo, filhos da mesma Mãe Terra e como tal temos direito de cultuar os Deuses e Deusas com os quais nos sentimos mais próximos ou aqueles que nos chamam para servi-los. Somos um Planeta, um só Povo, uma só raça: a raça humana!

(Autoria: Claudiney Prieto)

 

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Wicca, a religião da natureza

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A maioria das religiões mais visíveis na atualidade falam sobre a relação do ser humano com as outras pessoas, a Wicca vai muito além. Ela fala não só sobre as nossas relações humanas, mas também com os animais, natureza e conosco mesmos. Wiccanianos celebram a mudança das estações e das fases lunares através de rituais capazes de nos conectar comos fluxos e refluxos trazidos para a Terra e, conseqüentemente, para nossas vidas em decorrência dessas mudanças naturais.

A natureza é o coração e alma da religião Wicca que ensina que todos os seres, animados e inanimados possuem vida e são merecedores de nosso respeito e consideração. Sendo assim, vemos a natureza como diferentes faces da Deusa capazes de nos suportar, proteger, alimentar e manter vivos. Por esta razão, os Wiccanianos expressam uma grande reverência a natureza e buscam no seu dia adia formas de se integrarem à ela, procurando viver em harmonia com as leis naturais, levando em consideração formas de se viver ecologicamente, reciclando, reutilizando e reduzindo a exploração dos recursos naturais. A posição Pagã de reverência e preservação à natureza é completamente diferente daquela incentivada pelas religiões patriarcais, onde o homem foi ordenado a dominar e explorar os recursos naturais e o meio ambiente. Hoje em dia muitos Bruxos são ecologistas, ambientalistas, líderes comunitários, sempre preocupados com a atual situação ecológica e social.

A Wicca é uma religião muito plural e, sendo assim, diferentes Bruxos expressarão seu respeito pela Terra de formas variadas. Alguns são vegetarianos, outros recicladores conscientes e muitos ainda tornam-se ativistas ambientais engajados na luta e preservação da Terra. Cada um possui seu próprio chamado. Encarar a Terra como Sagrada é vital para os Wiccanianos. Isto facilita a conscientização de nosso verdadeiro lugar no mundo e na sociedade. Wiccanianos buscam a unidade com as forças naturais, com os animais, árvores, oceanos, sol, lua e estrelas por acreditarem que as forças da natureza são manifestações do Divino.

De acordo com o pensamento Wiccaniano, a Terra é um organismo vivo e quando preservada e reverenciada torna-se nossa aliada e não inimiga. O contrário ocorre quando ela é explorada e usurpada. Podemos perceber quantas doenças e desastres naturais estão ocorrendo nos últimos tempos por causa da exploração indiscriminada da Mãe Terra. Se tudo na natureza é vivo e possui um espírito, também carrega em si sabedoria, muito mais antiga e sábia, para ser compartilhada com os seres humanos do que os nossos conhecimentos atuais. As forças encontradas na natureza são antigas e desejam se comunicar conosco para ensinar a forma de curar a Terra e mostrar o caminho de volta a um modo de vida mais harmônico. Todos os Wiccanianos acreditam que a Terra está doente e que o retorno da Deusa será capaz de promover a cura da Mãe Terra. Por isso, devemos viver em harmonia com ela, reverenciando todas as formas de vida e precisamos desenvolver maneiras de nos religarmos à Deusa para que ela continue nos dando vida, força e energia para crescer. As principais características da Wicca como religião da natureza baseiam-se :

– Na crença de que rituais e poderes adormecidos dentro de nós precisam ser despertos para transformar e curar a vida.

– Na convicção de que devemos buscar através da natureza formas de entrar em contato com ela, buscando nossa reconexão com os seus fluxos naturais que invariavelmente trazem mudanças interiores em cada ser.

– Na afirmação da vida e de sua sacralidade da Terra como símbolo da perfeição, totalidade, unidade, completitude e cura para todos os males

– Nas forças da natureza como a energia sustentadora da vida, vendo nela a própria Deusa manifestada.

– Na preservação e cuidado com a natureza, considerada templo e moradia dos Deuses que acreditamos

A Wicca não é uma religião antropocêntrica e exatamente por isto não coloca as necessidades humanas acima daquelas encontradas na natureza. Sua filosofia prega um melhor relacionamento entre homem e natureza. Para a Wicca também não existe a idéia de que a natureza deve ser valorizada enquanto a humanidade deve ser desvalorizada. Para nós cada coisa tem a sua importância e lugar. A Terra é o corpo da Deusa e cada Wiccaniano através de suas atitudes, respeito à natureza e ações conscientes torna-se uma agulha fazendo a acupuntura que trará a cura para o mundo. Nós Bruxos acreditamos que o retorno da ligação com a natureza é a única maneira de preservar nossa própria existência, para vivermos melhor e em harmonia com toda a vida. Aprendendo a viver em conexão com a natureza os Wiccanianos forjam uma profunda ligação com o Divino.

(Fonte: Wicca para Todos, Claudiney Prieto)

 

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Wicca, Principio criador

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Para a Wicca, existe um Princípio Criador, que não tem nome e está além de todas as definições. Desse princípio, surgiram as duas grandes polaridades, que deram origem ao Universo e a todas as formas de vida.
Princípio Feminino

A Grande Mãe representa a Energia Universal Geradora, o útero de Toda Criação. é associada aos mistérios da Lua, da Intuição, da Noite, da Escuridão e da Receptividade. é o inconsciente, o lado escuro da mente que deve ser desvendado. A Lua nos mostra sempre uma face nova a cada sete dias, mas nunca morre, representando os mistérios da Vida Eterna. Na Wicca, a Deusa se mostra com três faces: a Virgem, a Mãe e a Velha Sábia, sendo que esta última ficou mais relacionada à Bruxa na imaginação popular. A Deusa Tríplice mostra os mistérios mais profundos da energia feminina, o poder da menstruação na mulher, e é também a contraparte Feminina presente em todos os homens, tão reprimida pela cultura patriarcal.

Princípio Masculino

 

Da mesma forma que toda luz nasce da escuridão, o Deus, símbolo solar da energia masculina, nasceu da Deusa, sendo seu complemento, e trazendo em si os atributos da coragem, pensamento lógico, fertilidade, saúde e alegria. Da mesma forma que o sol nasce e se põe, todos os dias, o Deus nos mostra os mistérios de Morte e do Renascimento. Na Wicca, o Deus nasce da Grande Mãe, cresce, se torna adulto, apaixona-se pela Deusa Virgem, eles fazem amor, a Deusa fica grávida, o Deus morre no inverno e renasce novamente, fechando o ciclo do renascimento, que coincide com os ciclos da Natureza, e mostra os ciclos da nossa própria vida. Para alguns, pode parecer incestuoso que o Deus seja filho e amante da Deusa, mas é preciso perceber o verdadeiro simbolismo do mito, pois do útero da Deusa todas as coisas vieram, e, para ele, tudo retornará. E, se pensarmos bem, as mulheres sempre foram mães de todos os homens, pelo seu poder de promover o renascimento espiritual do ser amado e de toda a Humanidade. O sentido profundo do simbolismo na Bruxaria só pode ser verdadeiramente entendido através da meditação e do contato intuitivo com a energia dos Deuses.

 

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Wicca, Principios e crenças

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Muitos consideram a Wicca uma religião Politeísta uma vez que reverenciamos várias divindades como faces da Deusa e do Deus. Mesmo podendo ser considerada Politeísta, por reverenciar vários Deuses, e até mesmo Monoteísta, uma vez que acredita em uma única fonte de energia (a Deusa), a Wicca é na realidade uma religião Henoteísta, observando a existência de várias divindades, mas atribuindo a criação de todas a uma divindade suprema: a Deusa. É também Panteísta em sua visão de mundo, o que significa o reconhecimento do Sagrado em todas as coisas, vendo Deuses e a natureza como sendo unidos. Assim, o mundo torna-se divino e sagrado em sua essência.

A Teoria do Efeito Borboleta, para descrever como pequenas variações podem afetar um gigante e complexo sistema, é extremamente compatível com a visão de mundo e espiritualidade propostas pela Wicca.

Para nós, o Divino não é algo transcendente e nem separado da humanidade. Ele está dentro, fora e ao nosso redor. Acreditamos que todas as coisas que existem são diferentes manifestações da Deusa, pois por Ela foram criadas. Isto desenvolve a idéia de que tudo esta interconectado, como fios de uma mesma teia que forma o grande todo. Se um de seusfios for danificado, toda a teia também será. Assim, prejuízos individuais são encarados de maneira coletiva e o dano de um é prejudicial para o todo. A isso damos o nome de imanência. Este conceito é muito antigo e podemos encontrar referências a ele em diversas culturas centradas na Terra. Recentemente a Física descobriu algo interessante que nomeou de “Efeito Borboleta”, que afirma cientificamente que tudo o que existe está interligado. Em termos de clima, por exemplo, isso traduz-se na noção deque uma borboleta que agite o ar com as suas asas hoje na Austrália pode influenciar tempestades no próximo mês no Texas. Isto demonstra que pequenas ações provocam conseqüências gigantescas e os princípios das crenças Wiccaniana estão fundamentados exatamente nisto. Este é o ponto de partida para entendimento da conduta e ética de um Bruxo. Ética consiste em padrões de conduta que incluem um julgamento e uma filosofia moral. Não existe nenhum conjunto de éticas que podem ser aplicadas a todas as pessoas, em todos os tempos e religiões. A ética é geralmente baseada em padrões locais e sociais de onde vivemos.

A Wicca não possui grandes listas de regras e leis para serem seguidas, mas existem certas condutas com as quais muitos Wiccanianos norteiam suas vidas. Todas elas são baseadas em um senso comum, os valores centrais, que é uma forte diretriz para a ética humana, inclusive a Wiccaniana. A Wicca é uma religião libertária, onde não existem diversas regras que digam oque devemos fazer ou como devemos viver. Apenas dois princípios são aceitos de maneira comum a todos os Wiccanianos: o Dogma da Arte, que é também chamado de Rede Wiccaniana, e a Lei Tríplice. Aqui encontram-se listados alguns dos princípios e crenças Wiccanianas mais comuns.

O DOGMA DA ARTE

“Faça o que quiser, desde que não faça mal a nada, nem ninguém”

Esta é seguramente a principal diretriz Wiccaniana e é levada em consideração todas as vezes que realizamos um ato mágico e no nosso comportamento diário. Assim como em muitas religiões a Wicca também pratica Magia. Nós Bruxos acreditamos que a mente e o corpo humano possuem o poder de efetuar mudanças nos acontecimentos de maneiras ainda não compreendidas pela ciência. Em nossos rituais, onde honramos nossos Deuses, realizamos diversos feitiços para inúmeros propósitos como cura e superação de problemas. No entanto, a Magia sempre é praticada de acordo com um código de ética que afirma que só podemos ajudar outros, ou a nós mesmos, respeitando o livre arbítrio das pessoas envolvidas e quando isso não prejudicar ninguém. Não fazer mal a nada nem NINGUÉM significa não prejudicar a natureza, as pessoas ao nosso redor e nós mesmos. Isso implica observar nosso modo devida, incluindo hábitos alimentares e comportamentais e principalmente viver em harmonia com a natureza levando em consideração os 3rs: Reduzir, Reciclar e Reutilizar. O Dogma da Arte incentiva o respeito e a celebração à diversidade, fazendo com que cada ser honre as diferenças existentes, repudiando todas as formas de preconceito, em vez de promulgar a intolerância. Esta atitude é a essência da Wicca.

A LEI TRÍPLICE

“Tudo o que fizermos, para o bem ou mal, a nós retornará triplicadamente e nesta encarnação”.

Esta é a Lei Tríplice que está fundamenta no poder da imanência. Se desejarmos o bem colheremos o bem, se fizermos o mal ele também retornará invariavelmente. Acreditamos que as energias que criamos influenciam o que acontece conosco. Ela é perfeitamente compatível com a lei de causa e efeito, ação e reação. Há até quem diga que Gardner retirou esse conceito das religiões orientais para incluí-lo na Wicca. A Lei Tríplice está centrada na Lei da imanência e é facilmente explicada pela teoria da teia da vida e do efeito borboleta. Ela é tríplice porque todas as ações, mágicas ou não, causam efeito na vida de quem prática o ato, sofre as ações desse ato, e indiretamente na vida daqueles que estão ligados da vítima dessa ação e no mundo ao nosso redor. É lógico e natural que estas ações voltem ao seu emissor em grau intensificado. isso pode ser facilmente explicada através de uma alegoria física e simples: ”

Se você plantar pimentas, não colherá morangos. Colherá pimenta numa quantidade muito maior do que plantou. Plante apenas uma semente de pimenta e terá uma pimenteira inteira”.

Esta lei divina não tem nada de cruel e nem é fruto de uma Deusa ou Deus injustos. Ela é fruto de nossas próprias ações e é provocada por nós mesmos enão por uma Divindade que irá nos punir em função de nossos feitos. Quem está nos punindo somos nós mesmos ao transgredir a regra mais importante da vida: o respeito ao livre arbítrio alheio. Isso não significa que fazer o mal é pecado ou coisa do gênero. O conceito de pecado não existe na Wicca. A Lei tríplice é chamada de lei pois é como uma lei que ela opera. Todos nós somos livres e podemos transgredir qualquer lei, mas sofreremos invariavelmente as consequências de nossos atos. Bruxos são pessoas sábias e sabem que aquilo que desejam representa a energia que vibram. Assim, se esforçam ao máximo para vibrarem num nível de energia positiva, canalizada para o bem de tudo e de todos. Se todos desejassem aos outros exatamente o que desejariam a si mesmos, em breve o mundo estaria repleto de bênçãos e positividade. A Lei Tríplice nos lembra que prejudicar outros traz prejuízo para nós mesmos. Vivemos num mundo onde compartilhamos a mesma energia. Se por um lado a Lei Tríplice pode trabalhar contra você, ela também pode trabalhar ao seu favor dependendo de seu comportamento, pensamentos e ações. Faça sua parte!

(Fonte: Wicca para todos, de Claudiney Prieto)

 

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A religiosidade no período medieval

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 Autoria de Ana Carolina Lappe do Prado Teixeira Neto

 

INTRODUÇÃO

O contexto histórico do período medieval foi marcado por aspectos relacionados ao terror: tortura, forte influência religiosa na vida do povo, bruxaria, colheitas mal sucedidas, miséria, marginalização, violência, crescimento demográfico acompanhado da falta de alimentos, supremacia do Estado perante os súditos, desigualdade social. A partir do estudo desses aspectos, a tentativa de se traçar um panorama da situação apresenta-se mais palpável.

 Entretanto, a análise isolada dos componentes históricos sem um olhar atento acerca da formação mental daquele período não é satisfatória para a sua plena compreensão. A nossa inserção em outro paradigma – obviamente bastante distinto do medieval – colabora com que vejamos outras situações diferentemente, a partir dos olhos da própria sociedade na qual fomos criados. Dessa forma, não é fácil, hoje, conceber a ideia de que torturar um indivíduo em praça pública teria finalidade didática ao resto do povo. Entretanto, a dor do condenado na Idade Média simbolizava aos demais a força do Estado e de Deus para com aqueles que ousassem transgredir as regras políticas e morais impostas. A tortura e a pena de morte, dentre outras medidas sancionatórias, eram algo que, por constituírem práticas correntes na época, justificavam-se e eram, de certa forma, dotadas de efetividade.

Destarte, procura-se aqui lançar um olhar mais abrangente acerca da presença da religiosidade no contexto social medieval, bem como uma breve análise das práticas da Inquisição e das acusações de bruxaria por meio de casos concretos.

A INFLUÊNCIA DA IGREJA NA SOCIEDADE MEDIEVAL

Europa, ano de 1666, Elizabeth Cubon foi acusada de prática de bruxaria. Em um período repleto de práticas ofensivas à integridade humana, a ré teve “sorte” em não ter morrido queimada na fogueira. O contexto histórico da Inquisição iniciou-se no século XIII e desde o seu princípio foi verificada a aplicação de procedimentos penais tidos atualmente como agressivos e atrozes. O estudo de tais procedimentos sancionadores deve estar acompanhado de uma análise histórica dos costumes, crenças e valores vigentes na época, os quais nos ajudarão a compor o paradigma vivido por aquela sociedade.

Hoje, com a tendência de valorização cada vez mais incisiva dos direitos humanos, direitos individuais, não é simples conceber as práticas de tortura utilizadas pela Inquisição. Todavia, na vigência do século XIV, por exemplo, a soberania da Igreja encontrava o seu poder no intenso temor a Deus compartilhado pela maior parte da sociedade. Caberia à Igreja, assim, a função de salvar os fiéis e de determinar a punição daquelas práticas que não condissessem com os ideais morais da Santa Igreja.

Carlo Ginzburg, em Mitos, Emblemas e Sinais, aponta de forma esclarecedora o simbolismo da “alteza”, isto é, aquilo inatingível, o que também engloba o que não deve ser questionado. Assim, reflete-se a manutenção desse simbolismo tanto pela esfera política quanto pela esfera religiosa. No que concerne à esfera política, havia a intenção excessivamente conservadora de manutenção da hierarquia social e política, censurando-se de maneira atroz qualquer um que ousasse desafiar a ordem Estatal. Frisa-se que a esfera religiosa atuava conjuntamente com a política, de modo que uma reforçava o poderio da outra; ademais, os dogmas religiosos eram incontestáveis: era vedado tentar conhecer os segredos de Deus. Ginzburg aponta o uso político da religião como o mais oculto dos segredos do poder.

Aliás, se adotarmos essa perspectiva do autor, teríamos, nesse uso político da religião, uma utilização indubitavelmente bem articulada.

Como exemplo de a legitimidade do poder conter um fundamento religioso, o historiador Quentin Skinner nos traz Bossuet que, em seu tratado Política retirada das palavras mesmas das Santas Escrituras, em 1679, afirmava que “todo súdito que resista às determinações de um rei, mesmo que este seja perverso, “seguramente receberá a condenação eterna”, e ainda que “toda resistência à autoridade constitui uma resistência ao mandamento divino” (p. 192).” (BOSSUET apud SKINNER, 1999, p. 393).

Destarte, e dado o poderio da Igreja, o principal instrumento por ela utilizado no período da Inquisição era o terror, o qual era incitado tanto pelas práticas de tortura e morte – havia incontáveis maneiras de se matar o indivíduo após a tortura – quanto pela interferência constante da esfera religiosa na vida da sociedade. Aliás, a eficácia da tortura e das penas capitais como teor didático durou enquanto não tinha lugar a concepção individualista. É o que demonstra Lynn Hunt em A Invenção dos direitos humanos: uma história. A princípio, o objetivo principal da prática pública da tortura seria o de servir de exemplo aos demais. Assim, as dores sofridas pelo condenado não pertenciam somente a ele, tendo propósitos políticos capazes de reafirmar a autoridade estatal e a ordem moral. Contudo, com o passar do tempo, essa questão mudou de figura, pois pela visão individualista a dor era apenas do indivíduo. Dessa forma, não mais caberia o sacrifício dele para o “bem” da comunidade. O corpo passou a ter um papel distinto daquele que tinha no início dessa prática e as pessoas começaram a se ver mais como indivíduos do que como mero “povo”.

Voltando-se à interferência da Igreja, a intolerância a quaisquer exercícios de questionamento adentrava a vida de cada um, tendo em vista que as denúncias eram muito bem-vindas ao Tribunal do Santo Ofício. A obra Dar a Alma, de Adriano Prosperi, demonstra essa intervenção do Santo Ofício na vida da mulher solteira, em busca de encontrar possíveis ocorrências de infanticídio – o qual, por sinal, era também rigidamente punido com a morte da mãe. Mais uma vez o terror das punições constando como didático, isto é, quanto pior a punição, mais claro ficaria à sociedade que as ordens impostas pela Igreja não deveriam ser violadas em qualquer hipótese. Prosperi narra que na Carolina a investigação de secretos infanticídios era extremamente invasiva no corpo feminino:

[…] bastava a presença de leite no seio ou, ainda mais, um crescimento e uma súbita normalização do ventre para que tivesse início o inquérito e fosse justificável o interrogatório com tortura. […] Uma vez comprovado, seguia-se uma punição extremamente severa[1].

A chamada “visita ginecológica” consistia na inspeção periódica do corpo das mulheres solteiras, o que revelava a desimportância da mulher, bem como o seu caráter secundário: o seu corpo não era sequer um quesito de sua própria autonomia, cabendo ao Estado e à Igreja decidir o que fazer ou não com ele.

A justificativa implicava na importância da instituição familiar para a Igreja, de modo que essa investigação seria legitimada por estar cumprindo os preceitos divinos. Foi assim que, em 1556, na França, tornou-se obrigatório informar a gravidez ao Estado. Ora, tal fato revela, e muito, a forte associação entre o Estado e a Igreja – são muitos os historiadores contemporâneos que entendem que o fim do Império Romano acarretou na perda de um sistema universal, isto é, deixou uma lacuna a ser preenchida pelos novos Estados que, por sua vez, buscavam essa universalidade na religião cristã. Assim, embora fosse uma medida imposta pelo rei Henrique II, encontrava em seu seio uma justificativa de cunho religioso, que norteava toda a sociedade da época. Aclara-se esse fato com a diferença, citada pelo autor, entre o infanticídio dentro de uma instituição familiar e o infanticídio praticado por mulheres que não eram casadas. Fato que demonstra que o condenável não era puramente o infanticídio, mas principalmente a sua prática por uma mulher que não compactuasse com o ideal de família da Igreja.

OS DELITOS DE FÉ

Como vimos, o controle social exercido pelo Santo Ofício era bastante aprimorado e qualquer ameaça a este modelo deveria ser banida de modo a não se proliferar. Esse mesmo cenário deu lugar à caça às bruxas, uma longa perseguição com históricos de tortura e matança em busca da “erradicação do mal”. Para Robert Mandrou, o sistema mental que consistia na caça às feiticeiras era constituído por três elementos básicos: uma forte crença cristã, uma experiência visível para todos do processo judiciário vigente e, por fim, sentenças, fogueiras, torturas, confissões e o que mais representasse o julgamento divino. Esses três pilares compunham satisfatoriamente a tradição da época, colaborando com a fundamentação e legitimidade do Poder Eclesiástico.

No que tange à esfera do Direito Canônico, dentre os delitos quanto à fé estavam: heresia, cisma, apostasia, blasfêmia, perjúrio, simonia, sacrilégio, magia, dentre outros[2]. Cabe, aqui, ressaltar que tais delitos dificilmente poderiam ser ocultados dos olhos dos Tribunais Eclesiásticos, uma vez que, como foi dito acima, estes dispunham de tentáculos que lhes permitiam infiltrar-se dentro da vida e da intimidade de cada um. A denúncia secreta era uma prática corrente na época, e a Inquisição apenas necessitava de um pequeno rastro, de uma pequena e aparente irregularidade, para desenvolver a sua investigação, dando continuidade ao processo.

Todas as pequenas querelas, todas as tagarelices de aldeia podem servir de base para denúncias, e para testemunhos acabrunhantes como os que se seguem: a aparência pouco atraente e a vestimenta do acusado, as extravagâncias do comportamento […] [3].

Iniciado o processo, era possível que o acusado sequer soubesse do que se tratava, uma vez que a denúncia era secreta e as provas testemunhais colhidas não lhe eram transmitidas. No entanto, algo era imprescindível: era exigida deste a confissão, a qual poderia ser obtida mediante a tortura, caso necessário. A importância da confissão estava no que esta representava o arrependimento do culpado, isto é, possibilitava demonstrar que este buscava voltar para o rebanho, do qual, vale dizer, nunca deveria ter saído. Aos olhos de hoje, pode-se discutir a possibilidade de a tortura ter ocasionado falsas confissões; entretanto, para os olhos da Igreja da época, não era por ocorrência da tortura que o acusado oferecia a confissão: para a Inquisição, se este confessava seu crime, era culpado. O princípio da presunção de inocência estava às moscas, já que quase nunca era utilizado. Evidente está que neste processo poucos dispunham de uma defesa efetiva.

COM RELAÇÃO À BRUXARIA

As ocorrências de bruxaria no final do século XII não se deram por mero acaso. A vida em uma sociedade tomada pela religiosidade fazia do dualismo Bem/Mal algo necessário ao entendimento entre o que era permitido segundo os desígnios morais/religiosos e o que era proibido. Desse modo, coube à Igreja apontar como demoníaco tudo aquilo que contestasse a sua ordem, como a prática de bruxaria. A ideia de que o Demônio estaria sempre na sociedade, pronto a provocar a tentação e o cometimento do pecado, foi acompanhada da crescente presença de bruxas, as quais estariam mancomunadas com o Mal.

Acrescenta-se que as consequências das práticas de magia, as quais em grande parte possuíam o intuito de dominar a natureza, ou mesmo de agir contrariamente a ela, dificilmente poderiam ser explicadas na época segundo a Ciência. Isso certamente corroborava com a sua condenação pela Igreja e com o juízo de que aquilo seria fruto de forças ocultas. Com relação aos objetivos dos sortilégios, esses eram os mais variados, podendo ter finalidade de adoentar, encantar, tornar colheitas improdutivas, ocasionar tempestades, provocar a impotência sexual – como nos seguintes trechos “feitiço de impotência, essa operação perversa que pretendia impedir a consumação do casamento” (MANDROU, 1979, p.68) e também “ O diabólico feitiço de impotência traduz certamente uma preocupação obsessiva largamente difundida” -, dentre muitos outros. Cabe aqui uma ressalva de que a “fama” dada pela Igreja às bruxas certamente era superior ao poder que realmente possuíam.

Pode-se dizer – não, porém, sem a devida cautela – que é possível que mulheres tidas como bruxas no período de sua perseguição pudessem ser pessoas com transtornos psíquicos, não compreendidas. Ademais, o ambiente em que viviam, no qual a superstição, a tradição e os mistérios eram demasiado presentes, também era em parte responsável por sugestionar a presença de práticas de feitiçaria. A ordem eclesiástica buscou coibir tais práticas de várias formas, sendo a fogueira uma das mais famosas. Depois de um longo processo inquisitório, constando a obtenção da sentença, a tortura, a confissão, etc., o corpo da feiticeira seria lançado ao fogo para erradicar o mal nele presente – embora valha lembrar que cada país possuía suas particularidades de como encarar os hereges. Robert Mandrou cita que, juntamente com o corpo, objetos – como livros, facas, imagens, e outros que pertencessem à bruxa – também eram queimados [4].

A caça às bruxas era facilitada pela sua denúncia, que podia ser feita sem que estas soubessem o seu delator. Nessas denúncias são frequentes os relatos concernentes às finalidades dos sortilégios, descritas aqui anteriormente.

Esses temores aldeões nutrem-se também por vezes da presunção imprudente das mulheres reputadas como feiticeiras que se gabam de seus poderes extraordinários na ocasião de uma tormenta ou de uma chuva há muito desejada. Por pouco que se fundam coincidências e rancores pessoais, os testemunhos acumulam rapidamente sobre os suspeitos todos os males: dores de rins, reumatismo, falsos partos e perdas de aves domésticas[5].

É interessante como a questão da colheita e da criação de animais é intensamente abordada nos relatos que dizem respeito à bruxaria. No caso de Elizabeth Cubon, o qual está anexado a este artigo, pode-se observar:

John Quay complained that when Elizabeth frequented Keg ny How’s house there were great losses in his cattle. As for his own crop after her visit in May, nothinge grew but oats and darnell; that he did not reape of 2 dayes plowing of barley but one bowle. Elizabeth frequented those places att the beginninge of every quarter of the yeare and that his cattle died, and since he gott an oath of her his cattle died not.

Além do caso em questão, há diversos outros em que uma queda drástica na colheita era tida como culpa das bruxas, ao passo que uma elevação na produtividade era fruto da ausência das feiticeiras; logo então se afigurava a denúncia. Ginzburg em Andarilhos do bem relata como os benandanti – tidos como os feiticeiros do bem, os quais se diziam combater em causa da fé – afirmavam aos inquisidores que, quando eram vencedores em sua luta contra as bruxas, a colheita era boa e abundante. Em contrapartida, quando estes perdiam a luta contra as bruxas, a colheita seria ruim.

Ora, qual seria a relação entre bruxaria e produtividade da colheita? Mandrou realiza um esclarecimento bastante oportuno quanto a isso. Primeiramente atesta-se que a maior parte das perseguidas era miserável, o que automaticamente elimina o benefício do confisco econômico de sua apreensão. E é justamente a miséria que nos encaminha ao segundo ponto: os rebanhos e as colheitas estavam constantemente entrando em crise, de modo que o desespero sem ter a quem pedir auxílio era recorrente. Desse modo, a atmosfera de terror criada pela própria estrutura da época contribuía com o terror gerado pela possibilidade de perda do único sustento disponível àquelas pessoas. A necessidade de acusar alguém pelas desgraças ocorridas e a imaginação condicionada pela superstição talvez tenham sido os motivos de culparem-se as bruxas.

O mito de que as bruxas possuíam o poder de se transformar em animais também era bastante difundido. O caso de Elizabeth Cubon traz várias denúncias de que esta se transformava frequentemente em uma lebre.

Two good Samaritans, Henry Maddrell, of Ballamaddrell, and William Cubbon, of Ballacubbon, stood surety for her. The main charges brought against her were that she had cast evil spells upon cattle, crops, and churning ; that she could transform herself into a hare ; and that she claimed the power to lessen or increase a man’s store.

O curioso é que o mito estava bastante disseminado, de modo que ter visto uma lebre no campo – um local perfeitamente normal para a ocorrência desse animal – era imediatamente associado à feiticeira em questão e à desgraça que adviesse em seguida. Assim, quando William Tyidesley e Mr. H. Calcott andavam e comentavam sobre Elizabeth Cubon, a égua de Mr. Calcott sofreu de um mal súbito e posteriormente faleceu. Uma minúcia oportuna: haviam avistado uma lebre durante o seu trajeto. O trecho segue:

[…]till they returned to the very selfe same place where the sd Mr. Calcott said, ‘What, doe you call Elizabeth Cubon a hare’ and there his Mare fell sick that she was not able to goe further, and was forced to leave her there and rid home behind Capt John Stanley . . . . and his sd Mare came home after but soone died.

Percebe-se que, naquele momento histórico, a relação entre o que se pensava justificar e o que de fato aquilo justificava era descoincidente: para aquela comunidade, tudo de ruim era fruto de feitiçaria. Ao analisar o caso de Elizabeth Cubon, observa-se que praticamente todos os relatos existentes contra ela são de associações míticas da acusada com acontecimentos externos – não há provas de fato que ela teria ocasionado a morte da égua, por exemplo. Entretanto, em razão de naquela época não haver melhor explicação para os acontecimentos, era cabível essa relação que se fazia.

Outro ponto interessante ao qual nos reportamos é a dificuldade, por vezes ocorrida, de a Justiça encontrar a prova dos frequentadores das cerimônias sabáticas. Uma das provas mais procuradas e satisfatórias era a marca de insensibilidade, também chamada de punctum diabolicum. Este era um sinal corpóreo que o Diabo colocaria em seus seguidores, de modo que nesse ponto o acusado não sentiria dor alguma e não correria sangue quando a agulha fosse retirada. “[…] a procura da prova faz-se […] com o concurso de médicos, de cirurgiões barbeiros que começam por raspar todo o corpo do acusado […]” (MANDROU, 1979, p.78). Era comum a ideia de que o Diabo poderia proteger os acusados para que estes não fossem descobertos, de modo que os juízes deveriam ser ainda mais espertos.

Robert Mandrou narra que um juiz responsável por um processo de feitiçaria era ocupado pelo medo de que pudesse ser enganado pelas mentiras satânicas, o que o faria desconfiar até das provas concretas; no séc. XVII, por exemplo, após uma procura interminável do punctum diabolicum, os juízes concluíram que o demônio teria interferido para ocultá-lo momentaneamente e enganar a justiça[6].

Como dito, os métodos de punição das práticas de bruxaria variavam bastante de um país para outro – enquanto um país empregava abundantemente a pena capital com relação às bruxas, outro país aplicava penas predominantemente brandas. Lynn Hunt nos conta, por exemplo, que a Grã-Bretanha tinha supostamente substituído a tortura judicial pelos júris no sec. XIII, mas a tortura ainda ocorria nos séculos XVI e XVII nos casos de sedição e feitiçaria.

Com o tempo, verificou-se que a Justiça Comum foi ocupando o lugar dos Tribunais Eclesiásticos no julgamento dessas práticas. No período de transição, em que as duas Justiças julgavam as feiticeiras, por vezes a penitência da Justiça Eclesiástica era mais branda, como se pode observar no caso de Elizabeth Cubon Kewin:

“The Sentence

Elizabeth Kewin for useing of unlawfull meanes in the nature of sorcery as appears by the foregoeing proofes is censured to doe 3 Sundayes penance in the parish churches of Kirk Malue, Kirk Arborey and KK Christ Rushen with a scheadule on her breast […]”

CONCLUSÃO

Ao longo desse breve panorama histórico relacionado a um paradigma diverso do nosso, um dos maiores desafios é o de observar a realidade daquela época a partir da neutralidade, mas sem perder a visão crítica. Ao iniciar-se este trabalho, as práticas de tortura foram caracterizadas como atrozes aos olhos atuais. O questionamento que se faz, então, é se os olhos atuais seriam os mais indicados para se entender o paradigma medieval. Frisa-se que a concepção do que constitui uma punição cruel sempre esteve intimamente associada às expectativas culturais vigentes.

Assim sendo, a tortura era encarada com grande naturalidade na Idade Média; era um instrumento de aplicação da justiça. Além disso, pode-se dizer que era, de certo modo, compatível com as rudes condições da vida medieval, de modo que a sociedade não encarava com estranheza a ocorrência de penas capitais e de tortura. Contestar as práticas vigorantes seria um ultraje, o que explica o lento processo de desuso da tortura. A Igreja provavelmente adotou a prática da tortura pelo fato de ela mesma estar inserida em um paradigma no qual esse costume era comum; ademais, a Igreja influenciava o paradigma medieval e também nele estava inserida.

Em última análise, a tortura servia indiretamente para salvar uma alma, tendo em vista que ela estava diretamente relacionada com a confissão e esta, como foi melhor explicado no trabalho, com a salvação de uma alma no plano espiritual.

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